ESTUDANTE |
PREMIAÇÃO |
CATEGORIA |
OBRA |
JOSÉ MAURÍCIO CAVALCANTI BAZANTE |
1º LUGAR |
TEXTO ESCRITO – ENSINO MÉDIO |
GOTA D’ÁGUA |
Creio ter sido acometido de um triste
preconceito para com o Texto Dramático como gênero literário. Preconceito
esse que durante todo o tempo que antecedera o ano de 2020, impediu-me de
entrar em contato com obras, que hoje julgo belas, de importantes dramaturgos
brasileiros. Feliz, todavia fico, de ter sido obrigado a deixar de lado minha
tolice com o testemunho marcante das palavras buarquenas. Gota D’Água, dos
autores Chico Buarque e Paulo Pontes, foi publicado em 1975, como o texto por
trás da peça de mesmo nome, e a mim apresentado como indicação literária pela
professora de Língua Portuguesa, como parte do projeto Biblioteca da Turma,
no início do ano passado. Baseado na tragédia grega de Eurípedes, a
versão à brasileira de Medéia apresenta-se para mim não como uma mera
releitura, mas sim uma ampliação do texto original, sobre o qual o brasileiro
se baseia para criar uma contemporânea obra retratando conflitos, em Gota,
não só éticos, mas sociais e de classe. Em pouco mais de 170 páginas, somos
apresentados a uma série de personagens da classe baixa brasileira. Joana,
mulher e mãe solteira de duas crianças, foi traída e abandonada pelo pai de
seus filhos, um sambista que alcança o sucesso ao compor e lançar a música
que dá nome ao livro e que se torna pretendente de Alma, filha de Creonte, um
burguês do ramo imobiliário que ganha a vida endividando pobres. É a partir de uma tradução
contextualizada da trama originalmente ambientada na Grécia Antiga para um
Brasil contemporâneo, periférico e mazelado, que Gota D’Água – Uma Tragédia
Brasileira, utiliza-se do enredo em primeiro plano, uma história
aparentemente sobre traição, ciúmes e vingança; para passar-nos naturalmente
uma intensa crítica ao neoliberalismo e ao sistema capitalista, ambos
criadores e propagadores de desigualdades e miséria. Por tal façanha que,
engrandecendo-se, a obra de Chico e Pontes ganha destaque em meio à
literatura brasileira e torna-se, para mim, maior que a original Medéia. Por meio de extensos e impactantes monólogos
e diálogos, uma ambientação que se dá por meio de descrições presentes ao
longo de todo o livro, relações e subtramas, poucas, mas muito bem
construídas; que Chico Buarque, grande nome da Música Popular Brasileira, e
Paulo Pontes, dramaturgo que padeceu ainda na ditadura militar, constroem um
retrato, infelizmente, atual e cirúrgico do País. Rebaixados à décima segunda
maior economia do mundo, com o produto interno bruto recuando, sucessivas
ameaças às instituições “democráticas” que ainda nos restam, 19 milhões de brasileiros
em estado de fome e metade da população em insegurança alimentar, Gota D’Água
é aqui e é agora. Fica, portanto, essa sugestão de
leitura a adolescentes já melhor introduzidos ao universo literário e a
pessoas de maioridade. Para ler ou reler o livro em questão na conjuntura do
Brasil no qual hoje sobrevivemos, é preciso atenção e comprometimento. Apesar
da fácil linguagem empregada no texto e da escrita fluida, desce amargo e
arranhando as verdades que muitas vezes nos negamos atestar: o que é o
Brasil. Referências: Saraiva. [saraiva.com.br] . Disponível em:
https://www.saraiva.com.br/gota-dagua-uma-tragedia-brasileira-313297/p.
Acessso em: 30 set. 2021. Saraiva. [saraiva.com.br] . Disponível em:
https://www.saraiva.com.br/medeia-3054208/p. Acessso em: 30 set. 2021. GOUVÊA,
Hilton. Morte do dramaturgo Paulo Pontes completa 40 anos. A União. João
Pessoa, 27 dez. 2016. Disponível em:
https://auniao.pb.gov.br/noticias/caderno_cultura/morte-do-dramaturgo-paulo-pontes-completa-40-anos.
Acesso em: 30 set. 2021. |
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ESTUDANTE |
PREMIAÇÃO |
CATEGORIA |
OBRA |
CAMILA DE SÁ VAZ |
2º LUGAR |
TEXTO ESCRITO – ENSINO MÉDIO |
TERRA
PAPAGALLI |
A ficção “Terra Papagalli”, escrita pelos
escritores brasileiros José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta, foi
publicada pela primeira vez na Editora Objetiva no ano de 2013. A obra
consiste em uma carta escrita por Cosme Fernandes, português que após ser
degradado por se relacionar com a filha de um nobre, embarca ao lado de Pedo
Álvares Cabral a caminho das índias, mas tem seu destino final nas terras
brasileiras. A carta tinha como objetivo contar a vida e obra de seu escritor
para seu filho primogênito, Vasco, à quem não o conhecia e não tinha
perspectiva de conhecer. Ao partir para as índias e acabar atracando
no Brasil, o Cosme junto com seis outros viajantes, foram surpreendidos pelo
destino com a ordem vinda de “deus” e da coroa portuguesa que os obrigava a
permanecerem nas terras outrora desconhecidas a fim de conhecer os nativos,
seus costumes, sua cultura e sua língua. No entanto, sem escolha, os sete
ex-prisioneiros portugueses seguiram em solo sul-americano e com facilidade
se misturaram aos indígenas tupiniquins, com quem passaram boa parte de suas
vidas juntos. Durante a narrativa, destacam-se as experiências vividas pelos
portugueses junto aos nativos, desde festividades locais até as grandes
guerras. Assim, é importante observar como os
personagens portugueses se referem aos nativos pois, diversas vezes, os
indígenas são retratados como bárbaros, gentios e pagãos, apenas por terem
uma cultura distinta, cultura essa muito relatada e questionada durante a
carta, tendo em vista que muitos rituais, festas e costumes dos indígenas não
eram compreendidos pelos portugueses que, portanto, os tratavam como
inferiores. Contudo, já se sabe que não existe cultura inferior ou superior,
apenas culturas diferentes. No decorrer da obra a descrição da fauna e da
flora brasileira é vasta, pois o Bacharel (como foi apelidado Cosme
Fernandes) ficou extasiado com tamanha biodiversidade e singularidade na
natureza da “terra dos papagaios” como foi chamado o território brasileiro
pelos seus novos habitantes, em homenagem aos papagaios, ave muito admirada
pelos lusitanos por sua capacidade de reproduzir a fala humana. A partir
disso surge o título do livro "Terra papagalli". Apesar da obra representar uma sátira bem
humorada do “descobrimento” do Brasil escrita no século XXI, seus autores
basearam sua escrita na carta de Pero Vaz de Caminha, com a qual percebe-se
diversas similaridades, entre elas a detalhista descrição da natureza, a dita
fidelidade com os acontecimentos, a forma de escrita semelhante a um diário
de bordo, além de expressões linguísticas da época retratada. Embora
a leitura seja fluida e dinâmica, é necessário certo conhecimento sócio histórico
sobre a época retratada, fazendo com que alguém que nunca estudou o
quinhentismo não entenda, em plenitude, alguns temas abordados no livro, pois
a intertextualidade diversa e a ironia com a história real são pontos
principais da obra. Durante as 134 páginas da sátira é interessante observar
o paralelo entre entre a história ali contada e os reais acontecimentos do
século XV, analisando de maneira crítica como essa parte da história é
retratada do livro relacionado-a com a Carta do Achamento, escrita por
Caminha. TORERO,
José Roberto; PIMENTA, Marcus Aurelius. Terra Papagalli. 1.Ed. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2013. |
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ESTUDANTE |
PREMIAÇÃO |
CATEGORIA |
OBRA |
LAURA MIRANDA PIMENTEL SILVA |
3º LUGAR |
TEXTO ESCRITO – ENSINO MÉDIO |
O SILENCIO ENSURDECEDOR |
Em “VOX” – romance de estreia da linguista
Christina Dalcher, publicado no Brasil em 2018 pela editora Arqueiro e com
tradução de Alves Calado –, um governo da extrema direita toma posse dos
Estados Unidos. Sua primeira ação é calar a voz de metade da população
considerada mais frágil, as mulheres. Como? Usando braceletes que as limitam
a cem palavras por dia. Caso ultrapassem, elas levam choques que aumentam
gradualmente, resultando na morte. O livro trata de uma crítica distópica ao
autoritarismo. A protagonista, a neurolinguista Dra. Jean McClellan, é uma
privilegiada e, por isso, nunca parou realmente para pensar na posição que
ocupava na sociedade. Sempre teve uma certa desconfiança com o movimento
feminista, mesmo que sua colega de quarto do tempo da faculdade tentasse
frequentemente convencê-la a participar.
Durante a narrativa, ela se pergunta qual o paradeiro da amiga. Pode-se dizer que o livro é dividido em duas
partes. Na primeira, vemos como o mundo se encontra e o cotidiano de Jean.
Deparamo-nos, então, mais com os sentimentos dela como um ser humano. Essa
parte é bem interessante: sentimos empatia e compaixão pela personagem quando
a vemos chegar ao ponto de sentir ódio e indignação pelos homens da sua
família, em decorrência dos privilégios que acumulam. Esses sentimentos a
fazem refletir bastante sobre quando ela tinha a oportunidade de ter lutado
por um futuro diferente, mas achava que, apenas com voto, já fazia o
suficiente. Na segunda parte, o irmão do “presidente”
sofre um acidente e danifica a área do cérebro que a protagonista pesquisava.
Oferecem a ela, então, a proposta de que, caso conseguisse curá-lo, teria
algumas vantagens, mas, quando Jean aceita, descobre o que há por trás dos
planos do governo. O
livro, em suma, é sem dúvida bem instigante: leva-nos a sair da zona de
conforto literária e a pensar bastante sobre a atual situação do nosso país.
Detectamos, ali, várias semelhanças com ditaduras, o que provoca numerosas
reflexões. A escrita é fluida, mas o texto deixou a desejar no final, que se
desdobrou rápido e fácil demais, tirando o impacto que o livro poderia ter
deixado. Recomendo-o para um público mais maduro e intelectualmente
disponível. Se estivéssemos em Vox, eu certamente já
estaria carbonizada. DALCHER,
Christina. VOX. Trad. Alves Calado. São Paulo: Arqueiro, 2018. |
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ESTUDANTE |
PREMIAÇÃO |
CATEGORIA |
OBRA |
BERNARDO
PAIM MUNIZ |
MENÇÃO
HONROSA |
TEXTO
ESCRITO – ENSINO MÉDIO |
AUTO DA BARCA DO INFERNO |
O Auto da Barca do Inferno foi escrito em
1517, por Gil Vicente, e faz uso de temas religiosos para apresentar uma
crítica à sociedade portuguesa do século dezesseis. Apesar disso, faz-se
extremamente atual e aponta para problemas relevantes ainda no cotidiano,
apresentando personagens variadas que servem como analogia para os pontos
negativos do nosso mundo hoje em dia. O texto dramático, isto é, aquele que
apreende a obra passiva de encenação teatral, é constituído de diálogos entre
as personagens. Personalidades essas como o diabo e o anjo, cuja função é
julgar as ações em vida daqueles que morreram e transportá-los para o outro
plano em suas embarcações, e as figuras que aparecem ao passar da história,
às quais a grande maioria é condenada ao inferno por suas vidas de pecado, de
excesso e de imoralidade. Personagens como o onzeneiro, a cafetina, o
fidalgo e assim por diante, são a personificação da falta de ética e valores
que assolava a sociedade em que o autor vivia, com os problemas da
prostituição, do consumismo desenfreado, do paganismo, da opressão dos mais
fortes para com as classes mais baixas, da tirania, da ganância, dentre
tantos outros, tendo motivado a sua escrita, que tem o objetivo de delatar e
satirizar esse comportamento da maioria dos lisboenses da época. É de senso comum que a proposta da obra foi
satisfeita, tendo em vista que provocou reflexão sobre as falhas dos
lusitanos como sociedade e inspirou as próximas gerações, sendo assim
recomendada para aqueles que almejam um pensamento crítico sobre moral e como
as pessoas se portam, mais especificamente, a leitura é indicada aos jovens,
para construírem esse tipo de pensamento o mais cedo possível. Acreditamos que Gil põe-se em uma posição de
juiz em que é livre para julgar os outros, porém esquece que ele é um humano
falho como qualquer um, e não deveria ser ele quem definiria se alguém é
merecedor ou não do inferno, algo completamente subjetivo e poder esse que
não deveria ser detido por um homem apenas. Ele talvez tentou assumir o lugar
do próprio diabo e determinar todos os erros das pessoas ao seu redor, como
se de alguma forma ele próprio não tivesse defeitos, sentindo-se tão superior
que provavelmente não percebe que poderia ser incluído na barca que acusa os
outros de pertencerem, com a soberba sendo seu pecado. VICENTE,
Gil. Auto da Barca do Inferno. São Paulo: Moderna, 2002. |
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ESTUDANTE |
PREMIAÇÃO |
CATEGORIA |
OBRA |
MIRIAM
GONZAGA DA SILVA SANTOS |
MENÇÃO
HONROSA |
TEXTO
ESCRITO – ENSINO MÉDIO |
TERRA PAPAGALLI: UM DOS MAIORES PLOT
TWIST QUE JÁ LI |
Diferente da narrativa apresentada por Pero
Vaz de Caminha, escrivão oficial da esquadra que embarcou pela primeira vez
em terras brasileiras, José Roberto Torero e Marcus Aurelius descrevem esse
histórico primeiro encontro na obra Terra Papagalli, a partir da visão de
Cosme Fernandes, um criminoso exilado de Portugal. A obra é escrita por
brasileiros e é bem recente, sendo publicada pela primeira vez em 2011, com
192 páginas pela editora Alfaguara. Devo
confessar que minhas primeiras impressões me fizeram imaginar que precisaria
de grandes esforços para continuar a leitura até o final, visto que,
demonstra-se, desde o início um ponto de vista preconceituoso e eurocêntrico
no contexto da colonização, causando em mim enormes frustrações, uma vez que
a foi obra escrita por brasileiros. Apesar disso, as cômicas tragédias
envolvendo a vida de Cosme desde o motivo de sua prisão até a viagem e sua
respectiva chegada, fazem com que a história se torne mais leve e fluída. Os
personagens são bem desenvolvidos e os diálogos são engraçados, sendo sete
degredados, desconhecidos entre si, em terra de língua, povo e costume
desconhecido. A expulsão da Europa que deveria se tornar um
purgatório acabou se tornando um verdadeiro paraíso para os criminosos, que
logo se familiarizam com os costumes regionais, além de criar laços
românticos com as mulheres. Sendo assim, Cosme narra a sua e a história de
seus companheiros em cartas e um pequeno diário direcionadas a um conde,
revelando grande desprezo pela cultura dos nativos, tidos por ele como
ingênuos e infiéis. Além de escrever dez mandamentos indicando como os
visitantes devem agir naquela terra para, facilmente conseguirem desfrutar dos
incontáveis recursos naturais. A grande reviravolta do livro, no
entanto, acontece quando o leitor aproxima-se do final do livro e percebe que
Cosme, mesmo sendo um exemplo de vilão da era moderna, próprio traficante de
negros e conservador de costumes racistas, constrói uma grande crítica às
práticas antigas e atuais para com a rica terra, terra essa que era vista por
ele como ‘O Paraíso’, mas que deixa de ser a partir de ações indiscriminadas,
que, embora não admita durante sua própria narrativa, ele mesmo contribui
para a destruição da Terra dos Papagaios, que vai-se e ressurge como uma
“nova Lisboa” chamada Brasil, um Brasil construído por ele, seus colegas de
viagem e todos europeus chamados colonizadores. Acredito
que as irônicas críticas estabelecidas na obra são muito significativas e
deveriam não só ser lidas, como relidas várias vezes por todas as pessoas que
gostam de enredos curtos, leves e empolgantes, além daqueles que tenham um conhecimento prévio da colonização
do Brasil e o desejam aprofundar, pois todos que a obra desejarem ler,
poderão aproveitar-se com tal leitura. |
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